sexta-feira, 7 de abril de 2017

Auto-retrato (Alexandre O'Neill)

Alexandre O'Neill


Depois da leitura do auto-retrato de Bocage, toca a ler o de Alexandre O'Neill, inspirado nele e com o toque de humor tão característico dele.


AUTO-RETRATO

O'Neill (Alexandre), moreno português,
cabelo asa de corvo; da angústia da cara,
nariguete que sobrepuja de través
a ferida desdenhosa e não cicatrizada.
Se a visagem de tal sujeito é o que vês
(omita-se o olho triste e a testa iluminada)
o retrato moral também tem os seus quês
(aqui, uma pequena frase censurada...)
No amor? No amor crê (ou não fosse ele O'Neill!)
e tem a veleidade de o saber fazer
(pois amor não há feito) das maneiras mil
que são a semovente estátua do prazer.
   Mas sofre de ternura, bebe de mais e ri-se
   do que neste soneto sobre si mesmo disse...

Alexandre O'Neill, in 'Poemas com Endereço'